Madre Mariana amiga e confidente de Nossa
Senhora do Bom Sucesso
Madre Mariana de Jesus Torres, religiosa
espanhola do século XVI, é somente serva de Deus e, talvez por isso, não se
conhece muito sobre sua vida. Mas foi a essa mulher que Nossa Senhora do Bom
Sucesso apareceu, revelando-lhe eventos extraordinários que abalariam a Igreja
nos tempos modernos – mais especificamente, no período que foi do fim do século
XIX a meados do século XX. Nessas aparições, a Virgem Santíssima não só
prometeu especial proteção a quem, em nossos tempos, propagasse a devoção a Ela
sob o título de Senhora do Bom Sucesso, como descreveu com abundantes detalhes
uma série de acontecimentos futuros, com um fundo realmente terrível.
Antes de qualquer coisa, é importante
lembrar o que diz o Magistério da Igreja sobre as chamadas "revelações
particulares". São estas as palavras do Catecismo da Igreja Católica:
"No decurso dos séculos tem havido
revelações ditas 'privadas', algumas das quais foram reconhecidas pela
autoridade da Igreja. Todavia, não pertencem ao depósito da fé. O seu papel não
é 'aperfeiçoar' ou 'completar' a Revelação definitiva de Cristo, mas ajudar a
vivê-la mais plenamente, numa determinada época da história. Guiado pelo
Magistério da Igreja, o sentir dos fiéis sabe discernir e guardar o que nestas
revelações constitui um apelo autêntico de Cristo ou dos seus santos à
Igreja."[1]
O ensinamento da Igreja é bem claro:
essas revelações privadas não precisam ser cridas pelo povo de Deus, já que
"não pertencem ao depósito da fé". É algo que deve ser aceito com
prudência, à medida que existam argumentos convincentes de sua veracidade:
"o sentir dos fiéis sabe discernir e guardar o que nestas revelações
constitui um apelo autêntico de Cristo". No entanto, ainda que ninguém
seja obrigado a dar crédito a nenhuma revelação privada, é preciso tomar
cuidado com a mentalidade deísta presente na argumentação de muitos céticos.
Como bem disse o Papa Bento XVI, "Deus não é uma hipótese remota, não é um
desconhecido que se retirou depois do 'big-bang'"[2]. É preciso ter em
mente que Deus, tendo criado o mundo, não o abandonou à própria sorte, mas a
sua Providência governa o mundo também hoje e, após revelar seu rosto em Jesus
Cristo, é perfeitamente possível que Ele intervenha de novo na história,
ajudando aqueles que pelejam pela fé neste mundo a "vivê-la mais
plenamente, numa determinada época da história".
O conteúdo das mensagens de Nossa Senhora
à Madre Mariana é realmente impressionante e pode ser consultado em uma
compilação disponível na Internet para download[3].
Mas extraordinárias não foram apenas as
revelações da Virgem Santíssima a essa serva de Deus, como também toda a sua
vida. Tendo nascido para o Céu com 72 anos de vida terrestre, o seu corpo,
durante todo o tempo em que foi velado, parecia apenas dormir: sua pele era
flácida, seus membros eram flexíveis e seu rosto ainda estava rosado. Com
efeito, alguns séculos depois, quando exumaram seu corpo, ele estava
incorrupto. Sem dúvida, um atestado miraculoso de sua santidade.
E Deus não se contentou em confirmar a
virtude apenas da vida de Madre Mariana. Mostrando a verdade de uma das
aparições de Sua Mãe, na qual ela prometia jamais faltarem irmãs santas no
convento de Quito, Cristo preservou incorruptos os corpos de inúmeras
religiosas da mesma casa em que viveu Madre Mariana, dentre as quais cinco eram
fundadoras do lugar.
Nascida Mariana Francisca, essa grande
mulher foi uma alma eleita, desde o berço. Um episódio particular de sua
infância aponta a incomum virtude que ela já demonstrava: um incêndio que
atingiu a igreja próxima à sua casa impedia-a de adorar Jesus sacramentado e,
por isso, ela "vê-se desolada e sofre a solidão de seu constante
Amante"[4.] Pouco tempo dois, a menina recebe a primeira comunhão e, em uma
visão mística, Jesus revela-lhe a sua vocação de religiosa.
Mariana tinha uma tia concepcionista[5].
O rei espanhol Filipe II recebe um pedido, da cidade de Quito, no Equador (à
época, colônia da Espanha), para fundar, nesse lugar, um mosteiro da Ordem da
Imaculada Conceição. Atendendo a esse pedido, o rei envia algumas religiosas ao
lugar e é fundado, então, o Monastério de Concepcionistas de Quito. Junto com
essas mulheres, está a pequena Mariana:
"Vítima dos incêndios de amor à
Maria Santíssima no mistério de sua Imaculada Conceição, esta inocente criatura
ao saber que se iria fundar na colônia o Mosteiro de sua Ordem, compreendeu ser
essa a voz de seu Amado que a chamava dizendo: 'Deixe tua Pátria e a casa de
teus pais, e o Rei dos Céus enamorar-se-á de tua beleza'."[6]
No trajeto, atravessando o Atlântico, a
embarcação que levava as religiosas enfrentou uma tempestade. Porém, não se
tratava de uma agitação qualquer, mas de um evento de índole verdadeiramente
sobrenatural. Durante a tempestade, Mariana e sua tia viram no mar "uma
serpente monstruosa de sete cabeças" que dizia: "Não permitirei a
fundação; não permitirei que progrida; não permitirei que se conserve até o fim
dos tempos e a todo momento a perseguirei"[7].
Tamanho evento, depois do qual a
Santíssima Virgem "estraçalhou" a cabeça da serpente, pode até ser
desacreditado, mas os milagres e as previsões que se seguiram a ele foram tão
fantásticos que atestam a intervenção poderosa de Deus na fundação desse
monastério. De fato, nesse convento de Quito, haveria uma fidelidade prometida
pelo Senhor: ali, sempre existiria uma religiosa santa, e o mosteiro serviria
como uma espécie de para-raios, a fim de conter os castigos divinos sobre a
humanidade.
Em Quito, é fundado o mosteiro e Mariana,
não tendo idade suficiente para a vida religiosa, limita-se a ajudar sua tia
"nas fainas domésticas e na instalação dos locais de trabalho da
Comunidade"[8]. Mas, tão logo ela cresce, entra no convento, faz seu
noviciado e professa seus votos, vivendo uma vida cheia de visões, experiências
místicas e penitências rigorosíssimas.
Logo nos primeiros anos de sua vida
religiosa, com 19 anos de idade, Madre Mariana é visitada por Jesus sofredor,
que lhe mostra os castigos que cairão sobre os homens do século XX. Então, ela:
"Viu três espadas sobre a cabeça do
Santo Cristo, e que em cada uma dizia: castigarei a heresia, a blasfêmia e a
impureza. (...) A Santíssima Virgem prosseguiu: 'Queres, minha filha,
sacrificar-te por esse povo?' Ao que respondeu: 'Minha vontade está pronta'. E
imediatamente as espadas se desprenderam do Santo Cristo, cravando-se no
coração da Madre Mariana, a qual caiu morta pela violência da dor."[9]
Nesse instante, Mariana morre e
apresenta-se diante de Deus. Ali, Jesus apresenta-lhe duas coroas – "uma
de glória imortal, cuja formosura ela não podia exprimir e outra de açucenas
cercadas de espinhos" – e pede-lhe que faça uma escolha. Ela,
compreendendo o significado das duas coroas e aconselhada pela Virgem
Santíssima, escolhe, "humilde e resignada, a coroa de açucenas coroada de
espinhos e voltou ao mundo para sofrer"[10].
Pergunta-se por que essas pessoas
escolhidas por Deus passam por tanto sofrimento. Em primeiro lugar, está a se
falar de almas eleitas, escolhidas por Deus para, já nesta terra, amá-Lo de
forma extraordinária. Ao mesmo tempo, porém, que o Senhor concedia a Madre
Mariana essa vocação de oferecer-se como vítima, dava a ela a sua graça, para
resistir fielmente. É certo que Mariana viveu um martírio extraordinário, mas a
mensagem de sua vida está em perfeita sintonia com as aparições de Nossa
Senhora de Fátima, nas quais era pedido aos três pastorinhos – Francisco,
Jacinta e Lúcia – e a toda a humanidade um espírito de penitência, já que
"muitas almas vão para o inferno por não haver quem se sacrifique e reze
por elas". Madre Mariana é, de forma clamorosa, aquilo que foram os três
pastorinhos de Fátima.
Perseguida por religiosas que não queriam
viver nem o rigor da regra franciscana nem uma vida de verdadeira penitência,
aprisionada injustamente por quatro vezes, Madre Mariana aceitava resignada
todas as humilhações e sofrimentos, oferecendo-as pelas pessoas do século XX.
Em dado momento, revoltadas por não
elegerem sua "capitã" como priora, um grupo de religiosas
desobedientes amotinaram-se contra Madre Mariana e decidiram sair do monastério
e ir à casa do bispo para que desse à sua líder o cargo de priora. Nesse
momento, Nossa Senhora da Paz, a Patronita, opera um verdadeiro milagre:
"Quando as monjas revoltosas já
começavam a romper o ferrolho para sair à igreja, vendo que não podiam abrir a
porta e sentindo-se acuadas (...), ouviram um ruído que lhes causou medo. –
Olharam para trás e viram a 'Patronita', que lhes virava as costas.
Assustaram-se sobremaneira e detiveram-se em silêncio; a santa Imagem então
lhes falou:
"'Infelizes, que fazeis? Ide, se
quereis, em boa hora, mas não tereis para onde regressar, pois Eu volto para a
Espanha com as Fundadoras e observantes. Tarde chorareis vossas loucuras e,
para perpétua memória deste caso, ficarei assim voltada de costas para vós,
para que sejais o escarmento de vossas menores'."
"E levantando a vista na direção da
santa Imagem, todas viram-na pálida, cheia de luzes e com o rosto severo.
Tentaram falar não se sabe o quê, mas todas caíram ao solo sem sentidos e
cadavéricas."
(...)
"Elas caminhavam com dificuldade, e
ao passar diante do rosto da santa Imagem, viram-na – o que também foi notado
pelas observantes – com o rosto pálido e expressão severa; de seus olhos
formosos se desprenderam três grandes lágrimas, que lentamente deslizaram pelas
faces."[11]
Após aquela revolta, é revelado à Madre
Mariana, em uma visão, que "essa pobre capitã não se salvaria, assim como
muitas de suas sequazes. (...) A essas melhor teria sido ficar no mundo do que
entrar na religião para levar uma vida de tanta dissipação e soltura".
Então, tomada pelo amor a Deus e ao próximo, Madre Mariana roga a Jesus pela
salvação das almas das irmãs inobservantes. Jesus assente-lhe, mas impõe-lhe um
novo holocausto:
"Não é a vida, nem a saúde, nem o
cárcere que quero de ti, minha amada Mariana, mas sim o sofrimento pelo período
de cinco anos consecutivos das penas do Inferno que a alma desta tua pobre irmã
teria sofrido por toda a eternidade. Marco-te cinco anos em memória das cinco
mais notáveis chagas de minha humanidade dolorida, durante minha paixão. Vê
porém, que durante este tempo eu Me ausentarei de tua vista material e não te
darei o menor consolo, nem alívio para tuas dores, assim como a alma desta tua
pobre irmã absolutamente não os teria tido no obscuro cárcere do
Inferno."[12]
Olhando para essa experiência de Madre
Mariana, é possível enxergar claramente aquilo que São João da Cruz definiu
como a "noite escura do espírito".
Além disso, essa fiel serva de Deus
passou por cinco anos realmente terríveis, pois, mesmo tendo se oferecido tão
generosamente justo pela vida da "capitã" – que, depois, se
converterá –, Mariana era constantemente maltratada por ela. Desse modo, essa
santa religiosa imitava fielmente o seu divino Esposo, que amou a humanidade
quando esta era sua inimiga, que veio padecer o inferno nesta terra – chegando
a clamar: "Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?"[13] –, a fim
de que o homem não fosse condenado ao inferno.
Toda a narração da vida dessa bendita
serva de Deus pode realmente impressionar-nos. – Mas, alguém pode dizer, o
Cristianismo não é esse "dolorismo", essa coisa crucificada... somos
a religião da ressurreição. – É verdade, somos a religião da ressurreição, mas,
sobretudo, somos a religião do amor. E não é possível a criatura humana amar de
forma perfeita sem que se purifique. Por isso o caminho espiritual começa pela
via purgativa: é preciso que nos penitenciemos, que matemos o homem velho que
existe em nós, mortificando a nossa carne manchada pelo pecado original.
Isso é muito importante para os
iniciantes na vida espiritual. Ajuda-os a enxergar aquilo que o Papa Francisco
observava no início de seu pontificado: que não é possível seguir Jesus Cristo
sem a Cruz. "Quando caminhamos sem a Cruz, edificamos sem a Cruz ou
confessamos um Cristo sem Cruz, não somos discípulos do Senhor: somos
mundanos"[14]. Assim como, no mundo civil, o governo quer fazer passar a
chamada "lei da palmada", impedindo os pais de castigarem seus filhos,
dentro da Igreja, tem vigorado uma espécie de "lei da palmada
espiritual": os cristãos pararam de fazer penitência; esqueceram-se do que
é aplicar uma disciplina, praticar um jejum, usar um cilício, dormir no chão
etc. E, justamente porque fizeram cessar as mortificações, começaram a se
tornar espiritualmente preguiçosos. Ora, o Concílio Vaticano II diz que
"ainda que, na Igreja, nem todos sigam pelo mesmo caminho, todos são (...)
chamados à santidade"[15]. O cristão não se pode descuidar dessa altíssima
vocação!
O método de Deus para tirar a Igreja das
múltiplas crises que ela enfrentou foi a santidade. Roguemos a Ele que nos
envie os Seus santos. E que também nós queiramos – e sejamos – santos.
Fonte: Pe. Paulo Ricardo www.padrepauloricardo.org